Acima das nuvens no Pico da Bandeira – ES / MG

Seguindo em frente com a nossa aventura por Espírito Santo, após passar por Vitória, Vila Velha, Domingos Martins e Venda Nova, continuamos rumo ao Parque Nacional do Caparaó com a missão de chegar ao 3º pico mais alto do Brasil.


O pódio nacional fica com essa gangue:

  • 1- Pico da Neblina (2993m)
  • 2- Pico 31 de Março (2974m)
  • 3- Pico da Bandeira (2892m)

Os dois primeiros ficam no meio da Floresta Amazônica, divisa com a Venezuela e são de difícil acesso. Sem um grupo maior, mais preparo e um planejamento extenso não é possível chegar. Mesmo assim, ainda estão na lista!
O escolhido do momento foi, portanto, o Pico da Bandeira, que além de estar entre os grandes, tem suas peculiaridades:

  • o pico fica em um parque com uma estrutura boa, de acesso relativamente fácil por estradas pavimentadas;
  • como ele está exatamente na divisa entre Espírito Santo e Minas Gerais existem duas opções de trilha por cada um dos estados;
  • é possível e recomendado fazer a subida durante a madrugada, para ver o nascer do sol já no topo;
  • ambas as paisagens noturna, durante a subida, com o céu cheio de estrelas, quando no topo, sobre as nuvens, são sensacionais;
  • para fechar a lista, há uma lenda que em raros dias, extremamente limpos e secos, é possível ver o mar de lá.

Tá bom ou querem mais?
Então lá vai. O site oficial do ICMbio – ParqueNacional do Caparaó tem muitas informações sobre tudo o que é necessário para fazer a subida, como chegar, onde ficar, o que levar, etc. Vou descrever a nossa experiência e em caso de dúvidas não hesitem em perguntar no final do post.

  • Portarias e Reserva do Camping: Como citei acima, é possível subir por MG ou ES. A trilha de ES é mais íngreme porém com paisagens mais bonitas, a de MG é mais tranquila e mais perto do topo os dois caminhos acabam se encontrando. Escolhemos fazer a trilha por ES mesmo e, por isso, entramos pela Portaria de Pedra Menina, com reserva para o Camping Casa Queimada, que fica dentro do parque e ao lado do início da trilha a pé. O Camping tem estrutura de banheiros, chuveiros apenas de água fria – importante informação caso você for levar sua dama – e mesas para fazer um lanche. Também tem uma área para estacionar o carro.

Para fazer a subida na madrugada é obrigatório fazer reserva no camping do parque pois as entradas e saídas se encerram às 18h. Normalmente reservam-se 2 dias para fazer caminhadas e conhecer as cachoeiras do parque e então subir na noite do segundo dia. Como estávamos no modo aventura, reservamos apenas 1 dia, para “descansar” e já levantar de madrugada para iniciar a subida.

  • Como chegar: além de carro é possível ir em ônibus e transporte público, porém, caso optem por estes últimos, é necessário fazer todo o trajeto da Portaria até o Camping a pé – aproximadamente 9,5km, com mochila e barraca nas costas. O Pedrão pode falar melhor mas esse trecho é íngreme e tem uns barrancos de respeito, o carro 1.0 pedia ajuda em alguns momentos.
Trecho da estrada Portaria -> Camping. Só faltou aparecer o Jason.

De carro, seguimos pela BR-262 e teoricamente deveríamos ter descido a ES-379 e ES-190 até Dores do Rio Preto, porém, a sinalização é bastante ruim na BR, principalmente se você quer entrar no parque pelo lado do ES. Não botamos fé nas estradinhas que encontramos, que pareciam mais de fazenda do que rodovias e, assim, continuamos seguindo. Acabamos passando reto até Minas Gerais, descendo a MG-108, MG-111 e finalmente a BR-482, uma volta no parque que nos custou uma hora a mais do que o planejado. Felizmente chegamos a tempo na Portaria, depois de uma boa estrada sinuosa.
Não se animem ainda, meus caros leitores, pois não acabou aí.

Depois da entrada pela Portaria ainda seguimos por uma estrada de terra, subindo mais um trecho da montanha por 40 min até chegar no Camping, já de noite.Vale lembrar que devido ao atraso não compramos muitos suprimentos para aquela noite, muito menos para o retorno.

Por sorte, havíamos ganhado uns 2kg de mexericas da mãe do Israel, bananas (salve Jorge) e o Pedrão tinha comprado gengibre.
Montamos a barraca e descansamos por algumas horas, o camping estava com mais 3 barracas e o pessoal estava se preparando para subir na madrugada também, com exceção de um senhor, amigo do Amyr Klink, para a surpresa do Pedrão, que subiria de manhã e acamparia próximo ao Pico (?). Brincadeiras a parte, quando chegamos lá em cima torci para ele estar ao menos preparado para aquele frio.

Pedrão equipado no começo da trilha.
  • É necessário contratar um guia? Essa era minha principal dúvida no início do planejamento pois estava com receio de chegar lá e não conseguir subir por conta.

Se você não costuma fazer trilhas e não tem confiança suficiente, a resposta é: contrate um guia. O site do parque tem contatos de guias de confiança, profissionais que moram ali mesmo na região.


Para os mais experientes, é possível subir sem guia sim. A trilha tem adesivos refletivos e setas ao longo de todo o percurso e, com exceção das regiões com plataformas de rocha, onde o percurso não fica muito claro, nas partes de terra a trilha é visível e demarcada. Mesmo assim, se for encarar a trilha à noite, recomendo levar uma lanterna de cabeça bem potente, para conseguir ver todos os adesivos ao longo do caminho e garantir uma boa mobilidade com as mãos livres. Nós levamos lanternas de mão muito boas mas não conseguíamos ver alguns adesivos mais distantes.

Exemplo de seta marcando o sentido da trilha nas partes rochosas.

Se mesmo assim estiver com dúvida, tem outro ponto a favor que é o pessoal do camping. Para garantir o sucesso e segurança, fizemos amizade e combinamos de subir todos juntos.


Dormimos pouco pois a ansiedade se misturava com o frio. Falando em frio, fomos em Agosto e de madrugada faz um frio considerável na área do camping. Por isso, é uma boa ideia levar uma jaqueta Anorak e uma segunda pele para usar por baixo da calça, se tiver uma jaqueta corta vento reserva é bom também para usar lá no pico. Outros acessórios interessantes para ter lá em cima são touca, cachecol e luvas. Suba com bota. O exercício ao longo da subida acaba esquentando mas lá no pico é muito frio, com sensação próxima e até abaixo de 0ºC. Para piorar, o corpo acaba esfriando ao longo da espera pelo nascer do sol.

  • A subida: Começamos a subir aproximadamente às 2:00am, com previsão de chegar no topo antes das 6am. O tempo da trilha varia entre 3 e 4 horas, de acordo com o ritmo do grupo. Começamos em uma pegada muito agressiva, desenferrujando todas as dobradiças, porém, como todos já estavam com a língua de fora, o grupo resolveu maneirar no passo. Fazíamos uma parada a cada 30-40min para descansar um pouco, comer e apreciar a tranquilidade da noite.
Próximo ao pico durante a subida.

A subida durante a madrugada reserva muitas surpresas boas. Enquanto subíamos, o caminho a ser percorrido era uma incógnita, gerando uma sensação de suspense e curiosidade de onde estaria o pico, se próximo ou ainda muito distante. Em relação so suspense, o Pedro lembra bem que ao jogar o foco da lanterna para as laterais da trilha, este desaparecia sem chegar em um ponto algum.


Mesmo nessa escuridão, conseguíamos ver estrelas e fracas luzes de cidades distantes. Por fim, uma imagem ficou gravada na minha cabeça nos diversos momentos que tentávamos encontrar indícios do pico: a escuridão da montanha, com seu contorno alto e sinuoso, fazendo fronteira e dividindo em dois o céu azul escuro estrelado.
Chegando finalmente no Pico a sensação de superação e realização foi muito grande, estávamos no 3º local mais alto no solo brasileiro, desse pequeno terreno de 8,5 milhões de km²!


Algumas pessoas já estavam ali, algumas sozinhas, outras em grupo enroladas em cobertores. Fazia muito frio. O Pedro ficou imóvel por um bom tempo, meditando e conservando o calor, atrás de um cruzeiro de concreto. Eu fechei minha jaqueta até o último dente do ziper para garantir que o calor não me deixasse.

Frio.
Ainda muito frio, mas o sol já estava querendo aparecer.

Ficamos aguardando o nascer do sol ansiosamente até que no horizonte uma luz alaranjada deu o ar da graça. Foi um momento impressionante porque além da felicidade do calor, começamos a ter finalmente a noção da altura, já que as nuvens usualmente altas estavam distantes lá embaixo. Tinham poucas nuvens e a visibilidade era boa, um mar de montanhas seguindo até o horizonte. Não, não conseguimos ver o mar J.

Vista com o sol já forte.
Pedro e a bandeira.
Eu do lado oposto do sol.

Passamos um tempo curtindo a vista e então começamos a descida, que foi bem mais tranquila, parando apenas 3 vezes. Só nossos joelhos que não concordaram com essa tranquilidade. Chegando perto do camping encontramos pessoas que começavam a subir, o sol estava a pino e imaginamos como a subida nesse horário deve ser cansativa. Eu recomendo fortemente subir durante a madrugada.

O Cruzeiro.
Água (?)

Já no camping, ambos morrendo de fome, adivinhem quem salvou nossa manhã? Elas mesmas, as saudosas mexericas! Devoramos umas 4 cada um.Mexericas correndo nas veias, empacotamos nossas coisas e voltamos direto para Vitória, com mais um pouco de Jorge Ben no rádio. Ainda tínhamos mais 2 dias e dessa vez ficamos em um hostel chamado Guanaaní, um casarão muito bonito na cidade alta, muito próximo ao Convento São Luiz.

Chegando lá participamos de um lual com uma galera mas pegamos de leve pois a viagem havia zerado nossas energias.
Para fechar a viagem, no dia seguinte fomos nas praias mais ao sul de Vitória, via Rodovia do Sol, ES-060. Fomos até a Barra do Jucu, passamos na frente do seu castelo e então paramos na Praia do Barrão, para comer num quiosque chamado Arol.

No lado norte da praia existe uma trilha curta no Morro da Concha, pegamos essa trilha para chegar em uma praia VIP – Praia da Concha, bem pequena e muito bonita. Devido à época, ambas as praias estavam com a água bem gelada! Só para os corajosos, o Pedro pode confirmar.

Praia do Barrão.

Infelizmente a visita à ES chegava ao fim, voltamos para Vitória para deixar o carro e pegar os vôos. Eu continuaria a viagem até a Chapada Diamantina – BA, enquanto o Pedrão voltava para Rio Claro – SP. Espero que tenham gostado e que esse relato desperte a vontade de subir os diversos picos aqui no Brasil e no mundo, até a próxima!

Praia da Concha.
Sempre trilhando caminhos.

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