Para quem está chegando agora, minha sugestão de ler os primeiros relatos: Cuba! Dicas Gerais e chegada em Havana & Trinidad e seu Charme, Cuba. Continuamos por Havana!
Chegamos em Havana no fim da tarde, revisitando a Yusie o Jorge. Em comparação com Trinidad, Havana é frenética, no pique de uma capital. Naquela noite um pouco chuvosa, seguimos a dica deles de jantar num lugar novo chamado Cha Cha Chá, em frente ao Museu da Revolução. O lugar era bem moderno para os padrões de Cuba e bem turístico, a comida era gostosa e foi interessante conhecer um lugar mais globalizado, provavelmente uma amostra de como serão os restaurantes na futura Cuba de economia mais aberta.
Continuamos caminhando mesmo sob garoa até uma das ruas mais famosas, O’Reilly. Lá é onde se concentram diversos bares como o Floridita, restaurantes com música ao vivo e mercados como o Água Y Jabon J. Naquela noite, paramos apenas para ouvir um pouco de música ao vivo em um bar aberto para a rua.
Foto no início do post: Universidade de Havana.
O outro dia amanheceu chuvoso e decidimos fazer o tour cultural pelos museus, iniciando no de Bellas Artes. Antes, tomamos café num lugar chamado La Pergola, pão, ovos mexidos, bacon e café preto com leite. Para a entrada nesse museu, paga-se 5 CUCs.
O Bellas Artes foi montado num prédio de arquitetura bem moderna, com ar condicionado e tudo mais, um destaque para os prédios antigos ao redor. Gostei bastante das obras, principalmente as do período do descobrimento e primeiros séculos, com muitas imagens das cidades de Trinidad e Havana, os costumes de época e a evolução do pensamento colonial até a independência e posterior era industrial.
Saindo de lá, procuramos um lugar para comer e descobrimos uma jóia rara, o restaurante italiano La Xana!, com nome infeliz porém de qualidade e preços surpreendentes. Foi lá onde tomamos os melhores drinks por 1,85 CUC e jantamos muito bem por 7 CUCs. Nesse dia comemos risoto de camarão e espagueti com frutos do mar.
Fomos então para o Museu da Revolução, no prédio que antigamente foi o palácio presidencial de Fulgêncio Batista, o ditador pré-Fidel. 8 CUCs para visitação, incluindo o Memorial Granma, logo atrás.
Eu esperava mais desse museu, afinal deveria expor com maestria as informações históricas de toda jornada e lutas até a tomada do poder em 1959. De qualquer forma, foi interessante percorrer as salas com os cartazes de texto detalhando a história linearmente no tempo, com mapas e estratégias, além dos pertences de alguns dos comandantes e soldados. Interessante também ver o papel das mulheres ativamente no front da guerra.
Interligado ao museu, está o Memorial Granma com alguns veículos bélicos, o iate Granma que chegou trazendo os combatentes do México, Che Guevara incluso, e a tocha que Fidel acendeu pessoalmente, em homenagem aos revolucionários que caíram em batalha.
Caminhamos até as estátuas e restos da antiga muralha de Havana, que ficam em frente ao museu, ali, encontramos uma réplica de José Martí em seu cavalo – a original encontra-se no Central Park em Nova Iorque (!) e, mais a frente, a do General Máximo Gómez. Voltamos para casa para nos prepararmos para a famosa cerimônia “Cañonazo a las nueve”, que acontece na Fortaleza de San Carlos de La Cabaña, do outro lado do canal de Havana. Estava um pouco chuvoso mas São Pedro nos deu uma trela durante o evento.
Devido à sua localização estratégica no centro do Golfo do México, dividindo as Américas do Sul e Norte, Cuba necessitava de proteção. A Coroa espanhola, ciente disso, ordenou a construção de uma muralha ao redor de Havana, completa em 1740. Para anunciar o fechamento e abertura dos portões de acesso à parte de Havana interior à muralha, fazia-se o disparo de canhões a partir da fortaleza.
Essa tradição se manteve mesmo após o desuso e posterior destruição da muralha em 1863 e acabou se transformando em um evento muito famoso entre turistas e cubanos. Assim, às 21h, pessoas vestidas como soldados espanhóis fazem uma encenação militar e por fim acendem o canhão, sem bala, claro. O tiro é o ápice do evento e o barulho surpreende a todos que estão presentes, arrancando aplausos.
Para chegar até a Fortaleza é possível pegar um táxi por 8-10CUCs cada trecho, um ônibus turístico, municipal ou a balsa. É recomendável chegar mais cedo para visitar a fortaleza, que também é um museu de guerra e proporciona uma vista privilegiada de Havana.
A noite não parou por aí, caros leitores, fomos provar o famoso Daiquirí no bar Floridita, o preferido de Ernest Hemmingway, que foi escritor e Nobel de Literatura, além de simpático à Cuba e onde viveu por 23 anos.
Seguindo pela rua O’Reilly, paramos em um outro bar chamado El Almendrón, de onde vinha uma música ao vivo contagiante. O lugar ficava no segundo andar e era no estilo moderno. Fechamos esse longo dia tomando alguns drinks enquanto assistíamos aos músicos.
No dia seguinte finalmente conseguimos tomar café na Casa de Yusi! Menu: goiaba, abacaxi e banana picados, pães com presunto, suco e café com leite, tudo muito gostoso. Nesse dia visitaríamos as atrações no bairro El Vedado, à oeste de Havana. Esse bairro foi uma região onde era proibido (vedado), no período colonial, o desmatamento da flora original, até que, posteriormente, a classe mais rica começou a se instalar ali construindo mansões e também lugares para entretenimento como bares e cinemas. Quando chegamos lá, percebemos ser um local mais nobre, um bairro planejado e arborizado.
Primeiro fomos até a “Plaza de la Revolución”, espaço onde também existe um monumento à ele, sim, José Martí, e aos comandantes Che Guevara e Camilo Cienfuegos. É uma área aberta bem grande e, por esse motivo, foi largamente utilizada nos diversos discursos de Fidel Castro. Para subir até o monumento de Martí paga-se 1CUC e para entrar no museu, 3CUCs.
Dali, caminhamos até a Universidade de Havana, construída no fim do Séc XIX. É imponente em seu estilo neoclássico, porém, mostra muitos traços de abandono e falta de investimento, como comentei mais acima. Lembrei muito de um trecho do filme Soy Cuba, de Mikhail Kalatozov, onde um dos personagens desce as escadarias em meados de 1950 para enfrentar os policiais anti-regime. Tiramos algumas fotos, corremos para dentro devido à chuva e então seguimos sentido o Malecon, atravessando El Vedado.
Almoçamos em um lugar bem peculiar chamado Las Bulerías e então fomos à famosa sorveteria Copellia. Lá, tomamos sorvete de manga, chocolate e morango, muitos saborosos – ainda voltaria lá pelo sorvete de manga! Se você só levar CUCs terá que acessar uma área externa com um pequeno quiosque, enquanto que com CUPs poderá provar mais sabores, que são servidos para os cubanos dentro do estabelecimento. Achei estranha essa exclusão mas mesmo assim ficamos satisfeitos em conhecer.
Tentamos ainda visitar o “Museo Nacional de la Danza”, mas por causa das fortes chuvas estava fechado por tempo indeterminado até conclusão da reforma do telhado. Assim, caminhamos mais até a orla da praia e ficamos ali por um tempo, curtindo o mar, tirando fotos e descansando. Após uma pancada de chuva de 5 rápidos minutos, muito comum em Cuba, pegamos o famoso Coco Táxi de volta para Havana Vieja.
Após voltar para casa, conversamos muito com Yusi e Jorge sobre Cuba. Como disse na primeira parte do relato de Cuba, eles fazem parte da nova era de empreendedores cubanos, alugando casas para turistas, assim como muitos outros em busca de uma melhor qualidade de vida. As atividades econômicas mais rentáveis em Cuba hoje são: 1. Turismo; 2. Mineração de Níquel pelo Canadá e China; 3. Café, Rum, Tabaco e Açúcar. Assim, faz sentido ver os esforços de todos voltados para o turismo.
Os moradores enxergam Cuba como sendo um país carente de riquezas, de um povo que vive no limite diariamente e que no final anestesia-se com entretenimentos razos e baratos, como novelas e bebidas. Ficamos espantados com o nível de expressão e inconformismo de Jorge ao responder nossas perguntas. Em um momento, quando a Ana fez uma pergunta sobre aposentadoria, o Jorge soltou um vívido: “¡No Hay!, no existe, ¿entiende?”, se referindo à situação de pobreza que muitas pessoas mais velhas tem que passar, sempre dependendo de uma ajuda de um parente.
Fazendo novamente a analogia ao “jeitinho cubano”, Jorge comentou que as pessoas que não trabalham com serviços relacionados ao turismo ou música, os mais rentáveis no país, para conseguirem uma melhor qualidade de vida recorrem à: 1. ajuda de parentes que conseguem ir trabalhar no exterior; 2. vendem equipamentos pertencentes ao estado de forma ilegal, por exemplo equipamentos médicos e afins; 3. no caso de produtores do campo, como comentei acima, declaram menos ao Estado para vender uma maior parte para pessoas que paguem um preço justo.
Inegável foi a sensação de segurança, que por sua vez era excelente. Não tivemos nenhum problema, mesmo quando caminhávamos à noite pela periferia de Habana Vieja. O Jorge comentou que as penas para roubos e furtos são severas, principalmente quando o alvo é um turista. Outros fatores que minam a violência são a menor disponibilidade de drogas, desestimulando a compra, a presença massiva das crianças na escola, ocupadas com o estudo e o baixíssimo poder aquisitivo da maioria da população, limitando em parte a oportunidade de se fazer dinheiro na venda de um objeto de alto valor.
Após essa conversa mais politizada, para fechar a noite, fomos jantar em um lugar “cool” porém com uma comida que não caiu muito bem, tacos e ceviche de camarão.
No dia seguinte, nosso terceiro em Havana após voltar de Trinidad, tomamos café novamente na casa onde estávamos hospedados e seguimos para mais um tour. Iniciamos pelo Capitólio, prédio monumental contruído em 1929 para abrigar a Câmara dos Deputados e então transformado em Assembléia Constituinte, se tornando após a revolução o Ministério da Ciência, Tecnologia e Meio ambiente. Atualmente, encontra-se em restauração e ainda não é possível visitar.
Continuamos até as docas, observando a Fortaleza e a estátua do Cristo de La Habana do outro lado. Ficamos um tempo ali até retornar. Foi um dia bem tranquilo, de caminhada e contemplação. Visitamos outro famoso bar onde Hemmingway tomava seus mojitos, La Bodeguita, e almoçamos em um restaurante bem moderno indicado pelo Trip Advisor, El Del Frente.
À noite, saímos em busca de um lugar para provar a cerveja cubana El Bucanero mas só acabamos tomando a Crystal, em companhia de alguns ratos que desceram do teto. Nome do lugar: Bosque Bolonha, ou Ratonha, para os íntimos.
Esses três dias que ficamos em Havana foram recheados de atividades, recomendo ficar o mesmo tempo para conseguir conhecer bem a cidade. Agora partiríamos para Cayo Largo, uma ilha ao sul de Cuba, com praias paradisíacas e tranquilidade.
Ainda voltaríamos para Havana, nosso QG, para conhecer Viñales e então nos despedir da cidade.
Nos nossos últimos dias em Havana nos hospedamos em Havana Vieja, na casa da Justina. Três lugares imperdíveis para ir: Salsa no Piano bar do hotel Florida, calle O’Bispo, todas as noites a partir das 21h, Lagosta no restaurante La Familia e, por fim, o restaurante La Imprenta, uma antiga fábrica de periódicos que foi transformada em um excepcional restaurante, com pratos perfeitos e decoração que alimentam muito bem o mais exigente amante de literatura.
Espero que tenham gostado do relato, comentem!